terça-feira, novembro 07, 2006

O séc. XVII, a distrair da vida?


"Rapariga com brinco de pérola" Vermeer van Delft


















Este é provavelmente um daqueles quadros que simplesmente tinham que ser pintados! É como algumas músicas ou livros - sentimos de modo intuitivo um imperativo de existência e nada mais!!!

O leve cair do lábio humedecido, o olhar envergonhado, mas já rendido, de quem está à beira de atravessar o limiar de um suposto sacrilégio que seria mostrar a Paixão ou um Desejo incontido de viver a Felicidade, junto de quem realmente sente a empatia e compreende o apelo da Sugestão Alquímica - que nunca se repete e, por isso, não deve ser perdida, em virtude de distracções induzidas por uma possível timidez -, enfim, a subtil inclinação do pescoço, como que numa posição forçada de um pudor cúmplice e encorajador - tudo ingredientes que abrem essa antecâmara para estórias que apenas ficam entre amantes.

Amantes que adquirem posições iguais e que se diluem um no outro, tornando-se num só, deixando de haver mestre e obra, pintor observador e modelo resignado - o mestre sabe render-se ao que lhe é mostrado e a obra acolhe-o no seu seio, ciente de que a sua conquista pela Sedução, também é a conquista daquele!

Na verdade não deixa de ser surpreendente o modo como Vermeer, que parece querer que dos seus quadros não saia nem um som, nos inspira e educa o ouvido para, lá bem no fundo da tela, distinguirmos, em suaves pinceladas encobertas na penumbra (idêntica à de Delf - cidade de canais), sons de uma suite para cravo que nos adormece serenamente, libertando enigmáticos aromas de uma qualquer droga que produz apetecíveis ilusões, precisa e contraditoriamente reais.

Mas a pintura é isso mesmo - a oferta de reais ilusões que cada um sente à sua maneira. Uma arte de liberdade, sem dúvida! Para distrair da vida, ou se calhar, e assim eu tenho para mim como certo, para vivê-la de modo mais iluminado e esclarecido, sendo esse o caminho da Felicidade!

Pela esplanada, à beira da Catedral, conversas sobre Arte!!!

1 comentário:

Anónimo disse...

Li. Perdi o fôlego. Senti a cabeça a andar à roda. Depois veio o arrepio. A cabeça ficou leve, leve. E pesada, pesada logo a seguir. Era inebriação. A causa? A beleza que a nossa amada (ainda que por muitos desamada) Língua Portuguesa assume naquilo que escreves. Obrigo-te a continuares...